terça-feira, 23 de novembro de 2010

Alucinógenos

Era 1938 quando o químico suíço Albert Hoffmann isolou o 25º composto do ácido lisérgico, a dietilamida do ácido lisérgico ou LSD-25, em um laboratório da companhia farmacêutica Sandoz. O ácido lisérgico havia sido isolado a partir de um fungo chamado ergot por pesquisadores do Instituto Rockefeller no início da década de 1930 e havia grande expectativa em torno dos seus usos medicinais.

Hoffmann começou a se sentir estranho e resolveu ir para sua residência. Já em casa, o pesquisador experimentou sensações que descreveu como “um fluxo ininterrupto de imagens fantásticas, formas extraordinárias, num jogo de cores intenso e caleidoscópico”. Enquanto ainda estava lúcido, o químico percebeu em suas mãos resquícios da substância que havia sintetizado horas antes.

Dias depois fez uso novamente da substância, desta vez de maneira consciente. Os delírios começaram e falava ininterruptamente frases indecifráveis. Pediu então que seu assistente chamasse um médico, pois um estado de pânico já o tomava. Em seguida, notou-se eufórico e visualizou formas e cores incomuns. O médico não percebeu qualquer problema, exceto as pupilas dilatadas. Hoffmann comentou a experiência com colegas, que ao utilizar sofreram efeitos semelhantes.

A Sandoz patenteou a substância e a distribuiu para pesquisas psiquiátricas com o nome de Delysid a partir de 1947. O laboratório recomendava que os próprios psiquiatras utilizassem a droga antes de darem aos seus pacientes para experimentarem por si próprios os efeitos.

Muitos estudos foram realizados até meados da década de 1960, quando o LSD foi proibido. Esperava-se que a droga pudesse gerar mudanças de personalidade ou estilo de vida e, por conseguinte, servir a propósitos como a cura do alcoolismo, o alívio do sofrimento relacionado a estresse pós-traumático e a cura da depressão e de outras doenças psíquicas. Os resultados foram considerados pouco efetivos e variavam muito de paciente para paciente.

A proibição do LSD está intimamente relacionada ao seu uso abusivo pela geração hippie e ao moralismo norte-americano da época. As pesquisas pararam e uma substância com algum potencial medicinal foi deixada de lado por décadas.

No final de 2007, pesquisadores suíços obtiveram autorização das autoridades locais para uma pesquisa com LSD em pacientes com câncer terminal ou outras doenças incuráveis. O objetivo é aliviar o sofrimento e ajudar na busca de um novo sentido espiritual, possibilitando um final de vida com menos sofrimento psíquico.

Albert Hoffmann faleceu no ano seguinte, aos 102 anos de idade. Ao tomar conhecimento de que uma nova pesquisa seria iniciada em torno do LSD declarou: "Meu maior desejo se realiza. Eu não pensava ver ainda vivo o dia em que o LSD encontrará seu lugar na medicina".

É uma lástima que pesquisas deixem de ser feitas em virtude de problemas sociais como foi o caso do LSD e de outras drogas que hoje são consideradas ilícitas. Os alucinógenos possuem um potencial interessante de se tornarem recursos medicinais, porém estou certo de que gerariam um problema social, pois fatalmente cairiam em mãos erradas e seriam utilizados irracionalmente.

Felizmente, nos últimos anos, muitas pesquisas surgiram acerca do uso medicinal de psicodélicos, principalmente no que diz respeito ao tratamento de depressão e stress pós-traumático e, se for possível deixar de lado o moralismo que envolve a questão, talvez tenhamos tratamentos ainda mais efetivos em um futuro próximo para problemas que afetam parcelas significativas da nossa sociedade.

A seguir, primeira parte do documentário produzido pela National Geographic. A próxima exibição será no dia 03/12/2010 às 23h.


quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Véspera de Exame

A tomografia está agendada para as 18h de hoje. Em alguns minutos irei ao hospital. É difícil descrever a sensação.

Minha mente diz: "acalma-te, é só mais um exame de rotina". O coração alterna entre batidas fortes e suaves. Acelera sempre que lembro dos exames, parece que vai saltar pela boca. Sinto como se estivesse diante de um tribunal, aguardando uma sentença, algo que pode novamente mudar o rumo da minha vida que se encaminha de volta ao seu ritmo habitual. É realmente difícil descrever.

Sei exatamente o que devo sentir. Sei que preciso ter calma, que não devo me preocupar com algo que não aconteceu, que sofrer de véspera é bobagem. Sei de tudo isso, não é preciso falar.

A parte difícil é conectar a mente ao coração, fazê-lo entender que não adianta entrar em pânico, ficar descompassado ou apertado no peito. Não consigo evitar sentir o que sinto. Não consigo ser racional assim.

Espero conseguir manter a calma e conter a ansiedade até os resultados. Sei que não é fácil, tenho que ocupar a cabeça e acalmar o coração.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Câncer na Antiguidade?

Uma matéria publicada no site da revista New Scientist no mês passado me chamou a atenção. O título: "Cancer is not a desease of the modern world" (Câncer não é uma doença do mundo moderno).

A reportagem aborda um estudo dos pesquisadores Rosalie David, da Universidade de Manchester, Inglaterra, e Michael Zimmermann da Universidade Villanova, Pensilvânia, que analisaram esqueletos antigos e múmias a procura de evidências de câncer na antiguidade. Além disso, a pesquisa se extendeu às literaturas grega e egípcia. Os achados foram muito escassos (um em quase mil corpos analisados) e diante disto a conclusão dos autores é de que o câncer era uma doença rara na época.

Uma declaração de David foi particularmente infeliz. Segundo ela, "não há nada no ambiente natural, que possa causar câncer. Por isso, tem de ser uma doença feita pelo homem, através da poluição e mudanças em nossa dieta e estilo de vida".

Certamente conhecemos muitos agentes naturais cancerígenos. A radiação ultravioleta que recebemos através do Sol é um exemplo. Fatores hereditários conhecidos, rochas radioativas, HPV e hepatite são outros exemplos. Apesar do exagero na afirmação da autora, não podemos negar que fatores como tabagismo, desequilíbrio alimentar, obesidade e alcoolismo, são malefícios da sociedade moderna que afetam o aumento desproporcional da doença em relação à população.

Boa parte da comunidade científica considera as evidências insuficientes. Vários fatores podem esclarecer os indícios escassos. Um deles é o fato de que na antiguidade a expectativa de vida era inferior a 50 anos e que, considerando os dados epidemiológicos - que sugerem que a incidência de boa parte dos cânceres aumenta significativamente após a quinta década de vida, seria realmente difícil ter muitos achados tendo em conta o tamanho da amostra. Outro argumento do estudo, de que não foram encontrados sinais da doença em, digamos, crianças-múmias, é facilmente explicável pelo baixo índice de câncer em crianças ainda hoje (algo em torno de 1 para 10.000). "Então, mesmo se você tivesse 10.000 múmias infantis, você seria sortudo de encontrar uma." disse Joachim Schüz da International Agency for Research on Cancer em Lyon, France.

Apesar de o estudo ser considerado insuficiente para provar que o câncer é uma doença moderna, é inegável o fato de que os índices têm aumentado significativamente nos últimos tempos e que muitos fatores relacionados ao nosso estilo de vida são responsáveis por estes incrementos nas taxas. Boa parte das conclusões feitas pelos autores podem ser convalidadas pelos dados epidemiológicos das últimas décadas e a tendência é de que estejam corretas.

Para quem quiser saber mais sobre o estudo:
Briefing: Cancer is not a disease of the modern world - New Scientist
Scientists suggest that cancer is man-made - Universidade de Manchester
Cientistas sugerem que câncer é uma doença moderna, causada pelo homem - Revista Galileu

domingo, 14 de novembro de 2010

Encontro Anual do CTOS

Ocorreu em Paris, no Hotel Le Meridien Etoile, entre os dias 11 e 13 de novembro de 2010, o encontro anual da CTOS - Connective Tissues Oncology Society - onde foram apresentados os mais recentes estudos para os mais diversos tipos de sarcomas. Para minha felicidade, o Dr. Júlio esteve presente.


O primeiro tema do encontro foi osteossarcoma, quando foram apresentados os estudos a seguir:


1- AGE AS A PROGNOSTIC FACTOR IN OSTEOSARCOMA: AN ANALYSIS OF PATIENTS TREATED ON NORTH AMERICAN COOPERATIVE GROUP STUDIES
(A idade como fator prognóstico em osteossarcoma: uma análise de pacientes tratados no North American Cooperative Group Studies)
K.A. Janeway; D.A. Barkauskas; M. Krailo; P.A. Meyers; C.L. Schwartz; D.H. Ebb; N.L. Seibel; H.E. Grier; R.G. Gorlick; N.M. Marina

2 - LOCAL RECURRENCE AND LIMB SALVAGE IN THE MULTIMODAL TREATMENT OF OSTEOSARCOMA. A RETROSPECTIVE ANALYSIS OF 1355 PATIENTS IN THE COOPERATIVE OSTEOSARCOMA STUDY GROUP (COSS) REGISTER
(Recorrência local e salvamento do membro no tratamento multimodal de osteossarcoma. Uma análise retrospectiva de 1355 pacientes no registro da Cooperative Osteosarcoma Study Group (COSS))
D. Andreou; S.S. Bielack; D. Carrle; M. Kevric; S. Fehlberg; R. Kotz; W. Winkelmann; G. Jundt; M. Werner; L. Kager; S. Lang; M. Dominkus; A. Hillmann; P. Reichardt; P. Tunn

3- A POOLED ANALYSIS OF FACTORS AFFECTING OUTCOMES IN 2407 PATIENTS FROM 16 ADJUVANT CLINICAL TRIALS IN OSTEOSARCOMA
(A análise agrupada dos fatores que afetam resultados em 2.407 pacientes de 16 ensaios clínicos adjuvantes no osteossarcoma)
D.M. Thomas; A. Herschtal; B. Hay; S. Smeland; M. Sydes; J. Whelan; S. Ferrari; A.S. Petrilli; A.
Bleyer

4- LONG-TERM LOCAL FOLLOW UP IMAGING AFTER TUMOR-RESECTION AND IMPLANTATION OF TUMOR ENDOPROSTHESIS IN PATIENTS WITH OSTEOSARCOMA: NESSECCARY AS A ROUTINE EXAMINATION OR NOT?
(Acompanhamento local por imagem a longo prazo após ressecção tumoral e implantação de endoprótese tumoral em pacientes com osteossarcoma: necessário como exame de rotina ou não?)
P. Tunn; P. Reichardt; M. Werner; S. Fehlberg; D. Andreou

5- A SNP AT -216 OF THE EGFR PROMOTER PREDICTS EGFR-IGF1R CROSSTALK AND RESISTANCE TO IGF1R INHIBITION IN OSTEOSARCOMA
E. Kolb; D. Kamara; D. Stabley; W. Zhang; P. Hingorani; R. Gorlick; K. Sol-Church

6- MICRORNA GENE NETWORK CONTRIBUTES TO OSTEOSARCOMA AND IS ASSOCIATED WITH SURVIVAL OUTCOME
(Rede de genes microRNA contribui para o osteossarcoma e está associada com resultado de sobrevivência)
V. Thayanithy; A.L. Sarver; R.V. Kartha; C. Park; M. Scott; A.Y. Angstadt; M. Breen; C.J. Steer;
J.F. Modiano; S. Subramanian

7- DEVELOPMENT OF NOVEL MOUSE MODELS TO INVESTIGATE THE MOLECULAR MECHANISMS OF METASTATIC OSTEOSARCOMA
(Desenvolvimento de novos modelos em ratos para investigar os mecanismos moleculares do osteossarcoma metastático)
J. Yustein; J. Roberts; L. Kurenbekova; L. Donehower

8- A PHASE II TRIAL OF SORAFENIB (SOR) IN RELAPSED AND NONRESECTABLE HIGH-GRADE OSTEOSARCOMA (OS) AFTER FAILURE OF STANDARD MULTIMODAL THERAPY: AN ITALIAN SARCOMA GROUP STUDY
(Ensaio fase II de sorafenib (SOR) em recidivante e não-ressecável osteossarcoma de alto grau (OS) após falha de terapia convencional multimodal: um estudo do Italian Sarcoma Group)
G. Grignani; E. Palmerini; P. Dileo; S. Asaftei; L. D'Ambrosio; P. Picci; M. Mercuri; F. Fagioli;
P.G. Casali; S. Ferrari; M. Aglietta

9- ANGIOTENSIN II RECEPTOR BLOCKER (ARB) SHOWS ANTI-TUMORAL ACTIVITY IN MURINE OSTEOSARCOMA
(Bloqueador dos receptores da angiostesina II (ARB) apresenta atividade anti-tumoral em osteossarcoma murino)
T. Fujimoto; A. Myoui; N. Hashimoto; H. Yoshikawa

10- SCYTHE/BAT3 REGULATES APOPTOTIC CELL DEATH INDUCED BY THE OSTEOSARCOMA ANTIGEN PBF IN HUMAN OSTEOSARCOMA
(SCYTHE/BAT3 ajusta morte celular por apoptose induzida pelo antígeno PBF em osteossarcoma humano)
T. Tsukahara; S. Kimura; S. Ichimiya; S. Kawaguchi; M. Kano; T. Wada; T. Torigoe; T. Yamashita; N. Sato

11 - FEASIBILITY OF VERY HIGH DOSE METHOTREXATE (VHD MTX) 12G/SQM TO 34 G/SQM : A RETROSPECTIVE STUDY OF 771 COURSES PERFORMED IN 46 PATIENTS WITH HIGH RISK OSTEOSARCOMA ( OS )
(Viabilidade de dose muito alta de methotrexate (VHD MTX) 12 g/m² a 34 g/m²: um estudo retrospectivo de 771 programas realizados em 46 pacientes com osteosarcoma de alto risco (OS))
H. Cornille; G. Delepine; B. Markowska; N. Delepine

12- VALIDITY OF AN AUTOMATIC MEASURE PROTOCOL IN DISTAL FEMUR FOR ALLOGRAFT SELECTION FROM A THREE-DIMENSIONAL VIRTUAL BONE BANK SYSTEM
(Eficácia de um protocolo de medida automática no fêmur distal para seleção de aloenxerto de um sistema de banco ósseo virtual tridimensional)
L. Aponte-Tinao; L. Ritacco; G. Farfalli; M. Ayerza; D. Muscolo; C. Seiler; M. Reyes; L. Nolte

13- EFFECT OF VANCOMYCIN ON INHIBITION OF IN VITRO GROWTH OF OSTEOSARCOMA CELLS
(Efeito de vancomicina na inibição de crescimento in vitro de células de osteossarcoma)
R.P. Dunlay; S. Wang; P. Moodie; T.E. McIff; K.J. Templeton; R. Garimella



Apesar de serem poucos os estudos para osteossarcoma, tenho confiança de que possam trazer inovações nas terapias atualmente utilizadas. Por ser considerado um tumor relativamente pouco frequente, poucas drogas são testadas e produzidas, tendo em conta que o retorno financeiro é inferior a outras neoplasias malignas como câncer de mama, próstata e pulmão, que lideram todas as estatísticas.

Dificilmente terei acesso aos estudos acima, entretanto fico feliz pelo simples fato de existirem. Particularmente, achei muito interessante e torço por resultados positivos dos estudos 8 e 13, nos quais novas drogas (sorafenib e vancomicina) estão sendo testadas. É mais uma esperança para quem vive ou viveu um osteossarcoma e as chances de aumento na sobrevida crescerão conforme surgirem novos tratamentos, portanto espero que tenha se conseguido alguma correlação positiva.

O estudo 11 também me chamou bastante a atenção. Atualmente, os protocolos de osteossarcoma mais utilizados prevêem 12g/m² de methotrexate e a pesquisa é sobre um possível aumento de dosagem para 34g/m² em casos de alto risco. Fico imaginando o impacto de uma dose como esta no organismo humano, levando em consideração que os níveis de administração atuais já apresentam efeitos colaterais significativos. É uma pena não ter acesso ao estudo para divulgar maiores detalhes e resultados.

Para quem quiser saber o programa completo do encontro, no qual aparecem estudos de outros tipos de sarcomas, segue link:
http://www.ctos.org/meeting/2010/program.pdf

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ainda Sobre o Chá Verde

Com a contribuição da nossa amiga Carin, encontramos um artigo que contra-indica o uso do chá verde concomitante à quimioterapia com BORTEZOMIB, utilizada em pacientes com mieloma múltiplo. De qualquer forma, sugiro a quem esteja recebendo quimioterapia ou qualquer outro tratamento que consulte seu médico antes de fazer uso mais efetivo do chá verde. Para quem não está em qualquer tratamento não existem contra-indicações, exceto para quem tem alguma restrição à cafeína.

Navegando pela internet encontrei uma reportagem com David Servan-Schreiber, autor de Anticâncer - Prevenir e vencer usando nossas defesas naturais, que foi apresentada no Globo Repórter há um tempo. A reportagem fala um pouco sobre a trajetória do pesquisador no combate à doença e também sobre a sua teoria anticâncer.






terça-feira, 9 de novembro de 2010

Chá Verde

É uma das discussões do momento na oncologia. Afinal, até que ponto a alimentação tem in- fluência no desenvol- vimento de tumores no nosso organismo? Alguns dizem que ainda não existem evidências cla- ras a respeito dos bene- fícios de uma alimen- tação saudável no que diz respeito à prevenção do câncer. Outros a- firmam e envidam esforços em pesquisas muitas vezes carentes de recursos na tentativa de estabelecer correlações positivas.

Fato é que existem muitos interesses (ou desinteresses) por trás de tudo isso. A bilionária indústria farmacêutica jamais investiria em pesquisas para analisar os efeitos do brócolis, do chá verde ou do cúrcuma na prevenção do câncer. Isto não significa que a culpa é das empresas que detêm as maiores fatias do mercado farmacêutico. É plenamente concebível que não invistam nessa área por não ser interessante economicamente. Estamos falando de empresas. Estamos falando de capitalismo (isto não é uma crítica, apenas uma constatação de como funciona o nosso mundo). Não fossem essas empresas e não teríamos tratamentos oncológicos tão avançados. Da mesma forma, ninguém desenvolve remédios apenas porque é "bonzinho". Existe a contrapartida financeira sempre e no caso da oncologia é uma bela contrapartida, mas isto é assunto para uma outra postagem.

Mas então quem deve investir em pesquisas desse tipo? Na minha opinião é o Estado. Trata-se de saúde pública, trata-se de bem-estar social, trata-se talvez de evitar uma epidemia ainda mais assustadora. Os números não mentem. Nas últimas décadas, principalmente no mundo Ocidental, o aumento do número de pacientes acometidos pelas variações da doença é desproporcional ao aumento da população. Os dados epidemiológicos dão conta desta dura realidade. Algo está errado. Algo tem que mudar.

A mim parece claro que existe algo errado no nosso modo de vida, mas isto é apenas uma opinião de alguém pouco experimentado no assunto. Apesar disso, me calcei de alguns estudos existentes na área, que apresentam indícios do que discorrerei a seguir.


O Chá Verde

O chá verde é uma bebida milenar que é fabricada a partir dos brotos novos de Camillia sinensis. Não se sabe exatamente sua origem, mais o mais provável é que tenha surgido na região da Índia e tenha chegado a China através da rota da seda.

A cultura ocidental incorporou o chá aos seus hábitos por volta de 1600, quando comerciantes portugueses começaram a importar a especiaria do mundo oriental. Nesta época, o chá era predominantemente verde, pois o chá preto ainda não havia se difundido na própria China. Ocorre que na sequência, devido à capacidade do chá preto de manter inalteradas suas propriedades, aroma e sabor por maior período de tempo, o chá verde passou a ser preterido e atualmente o chá mais consumido no Ocidente é preto.

A sua capacidade anticancerígena reside na abundância de polifenóis, especificamente flavonóis ou catequinas, que são moléculas complexas que agem no organismo humano inibindo a angiogênese, através do bloqueio do receptor de VEGF (ver o segundo vídeo da postagem Angiogênese). Até o momento, a Epigalocatequina-3-galato, mais conhecida como EGCG, é a molécula de origem nutricional mais poderosa nesse bloqueio.



A diferença entre o chá verde e o chá preto está no processo de fabricação. A fabricação do chá verde é capaz de manter a EGCG, enquanto que a do chá preto converte os polifenóis em pigmentos negros. Além disso, o chá verde tem até 4 vezes menos cafeína em sua composição.

In vitro, a EGCG foi capaz de inibir o crescimento de células de leucemias humanas, leucemias eritrocitárias, cânceres de rim, pele, mama, boca e próstata. Estudos em animais foram positivos para exposição a agentes cancerígenos causadores de cânceres de pele, mama, pulmão, esôfago, estômago e cólon. Um estudo publicado no Journal of Cancer Research & Clinical Oncology em 2004 sugere que a combinação do chá verde com a radioterapia em crianças com meduloblastoma traz mais efetividade ao tratamento. Outro estudo realizado em Harvard utilizando camundongos avaliou a combinação do chá verde com a soja e também apresentou resultados positivos na inibição do câncer de mama estrógeno positivo.

O ideal é que o uso do chá verde ocorra três vezes ao dia com infusões de 8 a 10 minutos (menos que 5 minutos só consegue extrair 20% das catequinas). Existem diferentes tipos de chá verde e a proporção de EGCG varia. Sencha-uchiyama, Gyokuro e Sencha são os que apresentam maior quantidade da molécula. Os três são japoneses. Deve-se consumir a bebida logo após o seu preparo, evitando as garrafas térmicas.

Faço uso do chá verde regularmente (ainda não atingi a frequência correta). O chá é muito gostoso e é perfeitamente possível dar conta das três xícaras por dia. Além disso, o hábito acaba por ajudar a criar outro hábito muito incentivado pelos nutricionistas, que é fazer cinco ou seis refeições por dia.

Para quem se interessar, seguem as fontes:
Anticancer: Prevenir e vencer usando as nossas defesas naturais - David Servan-Schreiber
Os alimentos contra o câncer - Richard Béliveau Ph.D., Denis Gingras Ph.D.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O Sol Voltou a Brilhar

O sol voltou a brilhar. Não falo apenas literalmente, o que seria justo em virtude da bela semana ensolarada que tivemos neste início de novembro. Ocorre que um novo tempo começou na minha vida. Um tempo de esperanças e desejos renovados. Mas o que seria capaz de desencadear isto? O que aconteceu de tão diferente? Nada.

No último ano (um pouco mais de um ano, é verdade) venci 15 ciclos de quimioterapia. Quinze. Durante a semana passada, mais precisamente entre domingo e sexta-feira, estive internado pela 11ª vez no Hospital da PUCRS. Décima primeira. Algo de diferente? Não.

É fato que a quimioterapia já se tornou algo corriqueiro na minha vida. Ainda assim, não consigo me acostumar a essa rotina. Principalmente esse dia-a-dia de hospital, esse estado de dependência em relação às pessoas que mais estimo, essa falta de liberdade, essa espécie de coleira que carrego no peito que me liga aos mais diversos medicamentos e, por conseguinte e paradoxalmente, me resgatará a uma vida normal. É como estar preso sem ter cometido qualquer crime.

Tantas vezes já tive vontade de arrancar os fios e me libertar dessa legítima tortura, mas, para minha fortuna, a sensatez acaba falando mais alto e passo a conviver com a ansiedade e com o marasmo com naturalidade. Isso não significa que eles inexistam, aliás, bem no sentido inverso, são bem concretos e visíveis no meu íntimo. Permaneço abraçado a eles pelo tempo necessário para que meu corpo se livre da droga que o salva.

O que resta de uma semana como essa são os novos horizontes que consigo enxergar. A cada ciclo é assim. Novas janelas se abrem. Novos caminhos se formam. Uma nova consciência se impõe. É impossível se manter inalterado. Aos meus renovados olhos, o Sol volta a brilhar após uma semana inteira de eclipse.

Resumindo toda essa conversa, a semana que se passou foi, como sempre, cansativa e extensa (a sensação é que um dia é mais longo que uma semana). Praticamente não tive náuseas, urinei bastante e os rins estiveram em perfeito funcionamento, tive dores pelo corpo em um nível normal, a língua apresentou um pouco de inchaço, o paladar esteve alterado e o apetite não foi internado comigo, ao menos não o vi por todo o tempo em que estive no hospital. Ainda prefiro todos estes efeitos ao tédio e à ansiedade. Por incrível que pareça, mesmo o tratamento sendo considerado agressivo e até mesmo violento ao corpo humano, os efeitos psicológicos experimentados são potencialmente mais danosos que os efeitos físicos. Outros pacientes podem ter opiniões distintas, mas até o momento no meu caso, esta é a verdade.

Agora terei um mês de folga pela frente. O próximo ciclo será no início de dezembro e até lá realizarei uma nova bateria de exames de imagem (tomografias de tórax, abdômen e membro inferior esquerdo e cintilografia óssea) para aferir o estado de meu organismo em relação ao câncer. Vamos torcer para que continue livre de qualquer manifestação da doença. Além disso, serei novamente submetido a um ecocardiograma, pois o próximo ciclo será a última aplicação de doxorrubicina (a droga vermelha). Depois disso serão mais duas internações e estarei pronto a remontar as coisas em seus devidos lugares.

Frase do dia: "A mente que se abre a uma nova idéia jamais voltará ao seu tamanho original." - Albert Einstein.


segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Enrolado

Estou internado desde ontem no quarto 912 do Hospital São Lucas da PUCRS. No momento estou recebendo methotrexate e soro simultaneamente. A aplicação já está no final e estou me sentindo bem. Agora a Denise está tirando uma foto minha para botar aqui no blog, mas não conseguirei postá-la hoje.
Estou totalmente conectado, mas não é só na internet. Um equipo me conecta à bomba que administra o soro. Outro me liga à bomba que administra a quimioterapia. Cada bomba está ligada a uma tomada diferente através dos respectivos cabos de força. Além disso tudo, ainda tem o cabo da internet e o fio do mouse. É muito fio. Às vezes me surpreendo todo enrolado em volta do "poste" (suporte para a medicação), mas já me acostumei a desfazer os nós.