sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Feliz 2011!

A todos que me acompanham, não tenho muito mais a dizer para esta data a não ser o que se repete a cada ano que se termina: Feliz Ano Novo! Que em 2011 tudo seja melhor do que foi em 2010, que tenhamos todos muita paz, saúde e felicidade, pois se tivermos isto, teremos tudo que precisamos para sermos plenos. O resto é consequência.

Meu 2010 foi ótimo, por mais incrível que isto possa parecer, muito melhor que 2009. Espero um 2011 ainda melhor que 2010, que a minha recuperação seja concluída da melhor forma e que todos nós sejamos/continuemos felizes.

Um grande abraço a todos!

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Natal: 2009, 2010

Impossível deixar de comparar. O Natal de 2009 deixou marcas importantes na minha história. Para quem não lembra ou não acompanhou, meu tumor foi descoberto quase três meses antes e estive internado até às 20h do dia 24 daquele ano. Era uma quinta-feira, ainda não estava em perfeitas condições para deixar o hospital, mas o risco de complicações já era insignificante. O Dr. Júlio surpreendeu a todos, que já estavam prontos para passar o Natal comigo no hospital, e me deu alta. Apesar de ainda carregar as úteis e prestativas muletas e estar sob alguns efeitos colaterais da quimioterapia, pude ceiar com a minha família em casa e na época considerei o maior presente de natal que já havia recebido, me fez muito feliz, um presente que não trocaria por qualquer dinheiro no mundo.

Como disse no início, impossível deixar de comparar. O Natal de 2010 foi mais leve. O clima foi realmente de celebração. Pudemos deixar um intervalo entre a quimioterapia e o Natal suficiente para que eu estivesse 100% bem. Um ano inteiro de incertezas está chegando ao fim e com um saldo muito positivo. Tudo ocorreu como desejamos. Não tive complicações maiores, estou novamente caminhando, os exames sugerem que estou livre de doença, a família ganhou novos membros, entre tantos outros motivos de alegria que tivemos entre as duas datas.

Enfim, lembrar do Natal de 2009 me faz chorar, mas não de tristeza e sim de orgulho. Orgulho de ter a família que tenho, orgulho por ter superado um momento tão difícil, orgulho por ter aproveitado uma oportunidade única na vida de aprender um pouco mais sobre o que realmente tem valor para mim. Me arrisco a dizer que aprendi mais sobre mim naquele único dia do que em muitos outros anos da minha vida. Talvez eu não seja compreendido por muitos, mas eu não trocaria um segundo sequer daquele dia por qualquer coisa nesse mundo!


sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Mais um Feliz Natal

Como é bom viver mais um Natal! Esta data é tão bela, tão cheia de significados. Para mim é um dos momentos mais marcantes do ano. Muito além da troca de presentes e a do próprio significado religioso da data para os cristãos, esta data se consolida como especial princi- palmente por ratificar a importância da família, instituição que vemos tão enfraquecida nos tempos atuais, o que para mim é a maior causa do caos social que se estabelece na nossa sociedade. Um tempo de paz, renovação e perdão. Um tempo para extrairmos de nossas entranhas o melhor de nós mesmos e compartilharmos com o mundo. A todos que me acompanham, um Feliz Natal!

Além de Natal, é aniversário da minha mãe, uma das pessoas que mais amo nessa vida e que me acompanha de perto nessa minha cruzada. Está ao meu lado em todos os momentos, nos bons e nos maus. Tantas noites passou em claro para cuidar de mim, tantos dias de ansiedade compartilhou comigo nas internações e quimioterapias na clínica, tantas vezes preparou especialmente a comida que pedi quando o apetite e o paladar faltaram. Mãe, não preciso te dizer o quanto és importante na minha vida. Muito obrigado pela criação que me deste, pelo amparo que me dás e pelo amor que sempre me darás. A tua dedicação incondicional é uma grande parte da minha vitória! Eu te amo. Feliz Aniversário!


quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A Derradeira Filgrastima

Ontem recebi a última dose de filgrastima. Foram 12 injeções subcutâneas para cada um dos seis ciclos de doxorrubicina que realizei. Ao todo foram 72 aplicações, todas em torno do umbigo.

Por curiosidade, pes- quisei o preço da medicação e fiquei surpreso. Uma caixa contendo 5 frascos de 1 mL cada custa em torno de de R$ 2.500,00, ou seja, cerca de R$ 500,00 por frasco. Fazendo um cálculo rápido, considerando a proporção de 1 mL por aplicação, 72 aplicações custaram R$ 36.000,00.

A medicação foi integralmente fornecida pelo plano de saúde. É nestas horas que vejo o quanto é importante ter um. Imaginem investir R$ 36.000,00 em recuperação de imunidade! E esta droga ainda é barata quando comparada aos quimioterápicos.

Não tenho certeza se o SUS fornece a filgrastima para tratamento profilático, mas já ouvi relatos de várias pessoas que possuem plano de saúde e enfrentam dificuldades para obter a quantidade certa do remédio. Em decorrência do preço elevado, os planos tendem a fornecer menos quantidade que o adequado. É a legítima "economia burra" para o plano de saúde e também para o SUS, pois o custo probabilístico correspondente ao risco de uma dose insuficiente da medicação resultar em uma internação indesejada supera em muitas vezes o valor da medicação na dose ideal. No meu caso, uma internação para curar uma infecção grave poderia ser mais cara do que os R$ 36.000,00 gastos com filgrastima em todo o tratamento.

Enfim, ontem a Ana (foto) aplicou a última dose deste ciclo. Foi a última aplicação em casa. Registro aqui o meu sincero agradecimento a Ana que se dedicou desde o primeiro ciclo a me ajudar com as injeções. Não bastasse o auxílio técnico, ela prestou um apoio ainda mais nobre: o humano, incentivando-me a prosseguir firme nessa luta tão difícil. O agradecimento é extensivo a Laura, a Patrícia e a Amanda que também ajudaram nos momentos em que a Ana, por motivos de saúde, esteve impedida de auxiliar. Ainda bem que tenho tantas vizinhas da área da saúde! São pessoas extraordinárias, anjos que apareceram no meu caminho! De coração, o meu muito obrigado!

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Náufrago: Últimos Dias

Fiz mais um exame de sangue hoje. Os re- sultados foram muito bons. Graças à fil- grastima que venho recebendo diariamente, os leucócitos ultra- passaram 13.000/μL, um índice acima do normal, mas perfei- tamente aceitável em virtude da medicação.

As plaquetas continuam poucas, mas já apresentam crescimento, totalizando agora 48.000/μL. Ainda não é suficiente, mas demonstra que meu corpo já começa a se recuperar. Por enquanto continuo sem fazer a barba e sem cortar o cabelo, mas os pelos do meu corpo já começaram a cair e até o final da semana deixarei o estilo "náufrago" para o estilo "Guiñazu" novamente.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Imunidade: OFF

Fiz exame de sangue ontem e o resultado foi o esperado: imunidade baixíssima e plaquetas muito abaixo da quantidade ideal. Tudo dentro da normalidade para o período pós-quimioterapia da droga vermelha.

Os leucócitos estão na faixa de 1.500/μL ao todo, sendo que os neutrófilos, que formam uma primeira linha de defesa para o organismo, estão em 150/μL (o mínimo deveria ser em torno de uns 1.500/μL). Já recebi oito doses de filgrastima de um total de doze, por injeções subcutâneas, e a tendência é que os leucócitos comecem a aumentar de quantidade nos próximos dias.

As plaquetas chegaram a 31.000/μL, sendo o valor normal entre 140.000/μL e 400.000/μL. Estou em estado de alerta para o caso de as plaquetas se reduzirem ainda mais. Neste caso, terei que recorrer ao hospital para realizar uma transfusão de plaquetas.

A recomendação do Dr. Júlio é ficar "de molho" como costumamos dizer. Continuar a reclusão em casa, seguir tomando cuidados com a alimentação (a famosa dieta dos cozidos e fervidos) e evitar cortes (fazer a barba, preparar alimentos com objetos cortantes...). Portanto, sigo com as mesmas atividades de sempre: computador, televisão, rádio e a família. Assim os dias vão passando e meu corpo se recuperando.

Quanto aos efeitos sensíveis da quimioterapia, estou apenas com a boca um pouco debilitada. O paladar continua prejudicado, a língua e as paredes internas um pouco inchadas e machucadas. As dores no corpo já passaram, mas sei que em alguns dias voltarão (quando a medula começa a se recuperar sempre sinto dores pelas costas).

Segunda-feira farei outro exame de sangue e terça-feira mais um. Agora é hora de manter os cuidados e o estado de alerta, além, é claro, de aproveitar o tempo ao lado da família.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Adeus Doxorrubicina

Acabou! Ontem recebi a sexta e última aplicação de doxorrubicina. Em princípio, nunca mais utilizarei esta droga. Mais uma etapa que se conclui! Mais um ciclo, o antepenúltimo!

Foi a última quimio- terapia na CliniOnco. Gostaria de agradecer aqui a todos os profissionais da clínica que sempre estiveram dispostos a ajudar e fizeram um excelente trabalho, demonstrando enorme zelo, comprometimento, amizade e profissionalismo. Tenho certeza de que foram grandes facilitadores da minha caminhada e com certeza compartilham da minha alegria.







Agora começarão os efeitos mais fortes, mas já sei tudo que pode acontecer e estou bem preparado. Serão 12 dias de reclusão em casa, com a dieta dos cozidos e fervidos, saídas só para ir ao Dr. Júlio e para fazer os exames de sangue. A partir de hoje começo a receber as filgrastimas, para auxiliar na recuperação da imunidade e, provavelmente, até o natal já esteja pronto para saborear uma bela ceia ao lado da família.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Mais um dia!

Mais um dia que se vai. Outra aplicação de doxorrubicina. Amanhã é o último dia do 16º ciclo. Hoje o dia foi super tranquilo, a Denise me acompanhou pela primeira vez em uma aplicação da droga vermelha.

Ainda ontem comecei a sentir aquele caracte- rístico cansaço nas pernas decorrente da quimioterapia. Tive também um pouco de dor de cabeça. Hoje ainda sinto esse cansaço nas pernas e o melhor mesmo é ficar um pouco mais deitado para relaxar. O apetite ainda está legal, pois a língua e a boca como um todo ainda não começaram a inchar e sentir os efeitos da droga. Mais um dia. Mais uma conquista. Mais um passo rumo à vitória.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A Última Vermelha

Iniciei hoje o último ciclo de doxorrubicina, a droga vermelha. Como ocorreu no ciclo anterior, foi precedida de 1 litro de soro fisiológico, ondansetrona (para prevenir enjoos), cloridrato de ranitidina (para prevenir úlceras e outros problemas gástricos), cloridrato de dexrazoxano (cardioprotetor, em virtude da dose acumulada da droga desde o início do tratamento). Na foto ao lado, a Viviane está fazendo a aplicação da droga e eu estou degustando gelo para minimizar a circulação sanguínea e consequentemente os efeitos da droga na região da boca. Cheguei à CliniOnco por volta das 10h e fui liberado às 13h20min.

Até o momento, estou bem disposto e os efeitos ainda não se manifestaram. O primeiro dia é, normalmente, tranquilo e indolor.
A aplicação continua amanhã e termina na quinta-feira. Por hoje, ainda consigo me alimentar normalmente. Ainda assim, é bom não abusar para não correr o risco de provocar náuseas e outros problemas. Também é necessário ingerir bastante líquido.


A Reunião dos Finkler



Domingo foi dia da festa anual do vô Juca, na qual se comemoraram os aniversários dele (87), da vó Lori (83) e do tio Ricardo (o primeiro filho sexagenário). É a única oportunidade do ano em que se consegue reunir os filhos, netos e bisnetos do vô Juca. Não pude comparecer no ano anterior em razão da quimioterapia, porém este ano pude celebrar com a família mais uma vez. Uma ocasião dessas para mim representa muito. A esta altura do ano passado, não tinha certeza se voltaria a estar lá, cercado de pessoas tão especiais na minha vida. É mais um troféu para a minha coleção, mais uma vitória que me dá força e coragem para seguir até o fim. Não consegui expressar a minha gratidão a todos pessoalmente, sou muito emotivo, certamente iria às lágrimas e levaria muitos comigo, portanto aqui está meu agradecimento: obrigado a todos por me acompanhar nesse caminho tão difícil que tenho percorrido nos últimos tempos. Cada palavra de apoio, cada gesto, cada telefonema, cada visita, cada recado no blog, cada oração. Tudo isto foi e é muito importante para mim e para minha vitória diante desta ímpia e injusta guerra. Família é a base de tudo. Quem tem uma família assim pode se orgulhar. Eu me orgulho!

Todo o agradecimento aqui é extensivo aos amigos, familiares (os Flores da vó Nerci) e seguidores do blog. Todos são muitos especiais para mim e são parte desta luta.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Alívio

É esta a sensação. Pelo menos até a próxima bateria de exames de rotina estou livre da ansiedade que me dominou na semana passada. Os resultados dos exames estão ótimos, tudo na mais perfeita ordem.

Ontem tive consulta. O Dr. Júlio regressou do encontro anual da CTOS - Connective Tissues Oncology Society - com novidades bem interessantes, entre elas uma nova medicação chamada Muramyl Tripeptide que, segundo estudos, quando utilizada em conjunto com o tratamento convencional aumentou a sobrevida em seis anos de 70% para 78%. Consegui encontrar o estudo na internet e pretendo examiná-lo e detalhá-lo aqui no blog nos próximos dias.

Semana que vem realizarei o 16º ciclo de quimioterapia. O último de doxorrubicina! Será a última queda de cabelo neste tratamento. Que cabelo? Para quem não me viu ultimamente, informo que meu cabelo está bem crescidinho, assim como sobrancelhas e cílios, e já tenho novamente o aspecto de pessoa saudável. O methotrexate não causa queda acentuada de cabelo em mim, mas a doxorrubicina é praticamente matemática: 13 ou 14 dias após o uso, inicia-se a queda total do cabelo e dos pelos do corpo. Portanto, nos próximos dias poderei novamente deixar o shampoo de lado.




Sábado passado visitamos o templo budista em Três Coroas/RS. Muito legal e muito belo o local, até conversei um pouco com um dos monges. É sempre interessante entender como outras pessoas enxergam a vida. Sempre existe algo a aprender.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Alucinógenos

Era 1938 quando o químico suíço Albert Hoffmann isolou o 25º composto do ácido lisérgico, a dietilamida do ácido lisérgico ou LSD-25, em um laboratório da companhia farmacêutica Sandoz. O ácido lisérgico havia sido isolado a partir de um fungo chamado ergot por pesquisadores do Instituto Rockefeller no início da década de 1930 e havia grande expectativa em torno dos seus usos medicinais.

Hoffmann começou a se sentir estranho e resolveu ir para sua residência. Já em casa, o pesquisador experimentou sensações que descreveu como “um fluxo ininterrupto de imagens fantásticas, formas extraordinárias, num jogo de cores intenso e caleidoscópico”. Enquanto ainda estava lúcido, o químico percebeu em suas mãos resquícios da substância que havia sintetizado horas antes.

Dias depois fez uso novamente da substância, desta vez de maneira consciente. Os delírios começaram e falava ininterruptamente frases indecifráveis. Pediu então que seu assistente chamasse um médico, pois um estado de pânico já o tomava. Em seguida, notou-se eufórico e visualizou formas e cores incomuns. O médico não percebeu qualquer problema, exceto as pupilas dilatadas. Hoffmann comentou a experiência com colegas, que ao utilizar sofreram efeitos semelhantes.

A Sandoz patenteou a substância e a distribuiu para pesquisas psiquiátricas com o nome de Delysid a partir de 1947. O laboratório recomendava que os próprios psiquiatras utilizassem a droga antes de darem aos seus pacientes para experimentarem por si próprios os efeitos.

Muitos estudos foram realizados até meados da década de 1960, quando o LSD foi proibido. Esperava-se que a droga pudesse gerar mudanças de personalidade ou estilo de vida e, por conseguinte, servir a propósitos como a cura do alcoolismo, o alívio do sofrimento relacionado a estresse pós-traumático e a cura da depressão e de outras doenças psíquicas. Os resultados foram considerados pouco efetivos e variavam muito de paciente para paciente.

A proibição do LSD está intimamente relacionada ao seu uso abusivo pela geração hippie e ao moralismo norte-americano da época. As pesquisas pararam e uma substância com algum potencial medicinal foi deixada de lado por décadas.

No final de 2007, pesquisadores suíços obtiveram autorização das autoridades locais para uma pesquisa com LSD em pacientes com câncer terminal ou outras doenças incuráveis. O objetivo é aliviar o sofrimento e ajudar na busca de um novo sentido espiritual, possibilitando um final de vida com menos sofrimento psíquico.

Albert Hoffmann faleceu no ano seguinte, aos 102 anos de idade. Ao tomar conhecimento de que uma nova pesquisa seria iniciada em torno do LSD declarou: "Meu maior desejo se realiza. Eu não pensava ver ainda vivo o dia em que o LSD encontrará seu lugar na medicina".

É uma lástima que pesquisas deixem de ser feitas em virtude de problemas sociais como foi o caso do LSD e de outras drogas que hoje são consideradas ilícitas. Os alucinógenos possuem um potencial interessante de se tornarem recursos medicinais, porém estou certo de que gerariam um problema social, pois fatalmente cairiam em mãos erradas e seriam utilizados irracionalmente.

Felizmente, nos últimos anos, muitas pesquisas surgiram acerca do uso medicinal de psicodélicos, principalmente no que diz respeito ao tratamento de depressão e stress pós-traumático e, se for possível deixar de lado o moralismo que envolve a questão, talvez tenhamos tratamentos ainda mais efetivos em um futuro próximo para problemas que afetam parcelas significativas da nossa sociedade.

A seguir, primeira parte do documentário produzido pela National Geographic. A próxima exibição será no dia 03/12/2010 às 23h.


quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Véspera de Exame

A tomografia está agendada para as 18h de hoje. Em alguns minutos irei ao hospital. É difícil descrever a sensação.

Minha mente diz: "acalma-te, é só mais um exame de rotina". O coração alterna entre batidas fortes e suaves. Acelera sempre que lembro dos exames, parece que vai saltar pela boca. Sinto como se estivesse diante de um tribunal, aguardando uma sentença, algo que pode novamente mudar o rumo da minha vida que se encaminha de volta ao seu ritmo habitual. É realmente difícil descrever.

Sei exatamente o que devo sentir. Sei que preciso ter calma, que não devo me preocupar com algo que não aconteceu, que sofrer de véspera é bobagem. Sei de tudo isso, não é preciso falar.

A parte difícil é conectar a mente ao coração, fazê-lo entender que não adianta entrar em pânico, ficar descompassado ou apertado no peito. Não consigo evitar sentir o que sinto. Não consigo ser racional assim.

Espero conseguir manter a calma e conter a ansiedade até os resultados. Sei que não é fácil, tenho que ocupar a cabeça e acalmar o coração.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Câncer na Antiguidade?

Uma matéria publicada no site da revista New Scientist no mês passado me chamou a atenção. O título: "Cancer is not a desease of the modern world" (Câncer não é uma doença do mundo moderno).

A reportagem aborda um estudo dos pesquisadores Rosalie David, da Universidade de Manchester, Inglaterra, e Michael Zimmermann da Universidade Villanova, Pensilvânia, que analisaram esqueletos antigos e múmias a procura de evidências de câncer na antiguidade. Além disso, a pesquisa se extendeu às literaturas grega e egípcia. Os achados foram muito escassos (um em quase mil corpos analisados) e diante disto a conclusão dos autores é de que o câncer era uma doença rara na época.

Uma declaração de David foi particularmente infeliz. Segundo ela, "não há nada no ambiente natural, que possa causar câncer. Por isso, tem de ser uma doença feita pelo homem, através da poluição e mudanças em nossa dieta e estilo de vida".

Certamente conhecemos muitos agentes naturais cancerígenos. A radiação ultravioleta que recebemos através do Sol é um exemplo. Fatores hereditários conhecidos, rochas radioativas, HPV e hepatite são outros exemplos. Apesar do exagero na afirmação da autora, não podemos negar que fatores como tabagismo, desequilíbrio alimentar, obesidade e alcoolismo, são malefícios da sociedade moderna que afetam o aumento desproporcional da doença em relação à população.

Boa parte da comunidade científica considera as evidências insuficientes. Vários fatores podem esclarecer os indícios escassos. Um deles é o fato de que na antiguidade a expectativa de vida era inferior a 50 anos e que, considerando os dados epidemiológicos - que sugerem que a incidência de boa parte dos cânceres aumenta significativamente após a quinta década de vida, seria realmente difícil ter muitos achados tendo em conta o tamanho da amostra. Outro argumento do estudo, de que não foram encontrados sinais da doença em, digamos, crianças-múmias, é facilmente explicável pelo baixo índice de câncer em crianças ainda hoje (algo em torno de 1 para 10.000). "Então, mesmo se você tivesse 10.000 múmias infantis, você seria sortudo de encontrar uma." disse Joachim Schüz da International Agency for Research on Cancer em Lyon, France.

Apesar de o estudo ser considerado insuficiente para provar que o câncer é uma doença moderna, é inegável o fato de que os índices têm aumentado significativamente nos últimos tempos e que muitos fatores relacionados ao nosso estilo de vida são responsáveis por estes incrementos nas taxas. Boa parte das conclusões feitas pelos autores podem ser convalidadas pelos dados epidemiológicos das últimas décadas e a tendência é de que estejam corretas.

Para quem quiser saber mais sobre o estudo:
Briefing: Cancer is not a disease of the modern world - New Scientist
Scientists suggest that cancer is man-made - Universidade de Manchester
Cientistas sugerem que câncer é uma doença moderna, causada pelo homem - Revista Galileu

domingo, 14 de novembro de 2010

Encontro Anual do CTOS

Ocorreu em Paris, no Hotel Le Meridien Etoile, entre os dias 11 e 13 de novembro de 2010, o encontro anual da CTOS - Connective Tissues Oncology Society - onde foram apresentados os mais recentes estudos para os mais diversos tipos de sarcomas. Para minha felicidade, o Dr. Júlio esteve presente.


O primeiro tema do encontro foi osteossarcoma, quando foram apresentados os estudos a seguir:


1- AGE AS A PROGNOSTIC FACTOR IN OSTEOSARCOMA: AN ANALYSIS OF PATIENTS TREATED ON NORTH AMERICAN COOPERATIVE GROUP STUDIES
(A idade como fator prognóstico em osteossarcoma: uma análise de pacientes tratados no North American Cooperative Group Studies)
K.A. Janeway; D.A. Barkauskas; M. Krailo; P.A. Meyers; C.L. Schwartz; D.H. Ebb; N.L. Seibel; H.E. Grier; R.G. Gorlick; N.M. Marina

2 - LOCAL RECURRENCE AND LIMB SALVAGE IN THE MULTIMODAL TREATMENT OF OSTEOSARCOMA. A RETROSPECTIVE ANALYSIS OF 1355 PATIENTS IN THE COOPERATIVE OSTEOSARCOMA STUDY GROUP (COSS) REGISTER
(Recorrência local e salvamento do membro no tratamento multimodal de osteossarcoma. Uma análise retrospectiva de 1355 pacientes no registro da Cooperative Osteosarcoma Study Group (COSS))
D. Andreou; S.S. Bielack; D. Carrle; M. Kevric; S. Fehlberg; R. Kotz; W. Winkelmann; G. Jundt; M. Werner; L. Kager; S. Lang; M. Dominkus; A. Hillmann; P. Reichardt; P. Tunn

3- A POOLED ANALYSIS OF FACTORS AFFECTING OUTCOMES IN 2407 PATIENTS FROM 16 ADJUVANT CLINICAL TRIALS IN OSTEOSARCOMA
(A análise agrupada dos fatores que afetam resultados em 2.407 pacientes de 16 ensaios clínicos adjuvantes no osteossarcoma)
D.M. Thomas; A. Herschtal; B. Hay; S. Smeland; M. Sydes; J. Whelan; S. Ferrari; A.S. Petrilli; A.
Bleyer

4- LONG-TERM LOCAL FOLLOW UP IMAGING AFTER TUMOR-RESECTION AND IMPLANTATION OF TUMOR ENDOPROSTHESIS IN PATIENTS WITH OSTEOSARCOMA: NESSECCARY AS A ROUTINE EXAMINATION OR NOT?
(Acompanhamento local por imagem a longo prazo após ressecção tumoral e implantação de endoprótese tumoral em pacientes com osteossarcoma: necessário como exame de rotina ou não?)
P. Tunn; P. Reichardt; M. Werner; S. Fehlberg; D. Andreou

5- A SNP AT -216 OF THE EGFR PROMOTER PREDICTS EGFR-IGF1R CROSSTALK AND RESISTANCE TO IGF1R INHIBITION IN OSTEOSARCOMA
E. Kolb; D. Kamara; D. Stabley; W. Zhang; P. Hingorani; R. Gorlick; K. Sol-Church

6- MICRORNA GENE NETWORK CONTRIBUTES TO OSTEOSARCOMA AND IS ASSOCIATED WITH SURVIVAL OUTCOME
(Rede de genes microRNA contribui para o osteossarcoma e está associada com resultado de sobrevivência)
V. Thayanithy; A.L. Sarver; R.V. Kartha; C. Park; M. Scott; A.Y. Angstadt; M. Breen; C.J. Steer;
J.F. Modiano; S. Subramanian

7- DEVELOPMENT OF NOVEL MOUSE MODELS TO INVESTIGATE THE MOLECULAR MECHANISMS OF METASTATIC OSTEOSARCOMA
(Desenvolvimento de novos modelos em ratos para investigar os mecanismos moleculares do osteossarcoma metastático)
J. Yustein; J. Roberts; L. Kurenbekova; L. Donehower

8- A PHASE II TRIAL OF SORAFENIB (SOR) IN RELAPSED AND NONRESECTABLE HIGH-GRADE OSTEOSARCOMA (OS) AFTER FAILURE OF STANDARD MULTIMODAL THERAPY: AN ITALIAN SARCOMA GROUP STUDY
(Ensaio fase II de sorafenib (SOR) em recidivante e não-ressecável osteossarcoma de alto grau (OS) após falha de terapia convencional multimodal: um estudo do Italian Sarcoma Group)
G. Grignani; E. Palmerini; P. Dileo; S. Asaftei; L. D'Ambrosio; P. Picci; M. Mercuri; F. Fagioli;
P.G. Casali; S. Ferrari; M. Aglietta

9- ANGIOTENSIN II RECEPTOR BLOCKER (ARB) SHOWS ANTI-TUMORAL ACTIVITY IN MURINE OSTEOSARCOMA
(Bloqueador dos receptores da angiostesina II (ARB) apresenta atividade anti-tumoral em osteossarcoma murino)
T. Fujimoto; A. Myoui; N. Hashimoto; H. Yoshikawa

10- SCYTHE/BAT3 REGULATES APOPTOTIC CELL DEATH INDUCED BY THE OSTEOSARCOMA ANTIGEN PBF IN HUMAN OSTEOSARCOMA
(SCYTHE/BAT3 ajusta morte celular por apoptose induzida pelo antígeno PBF em osteossarcoma humano)
T. Tsukahara; S. Kimura; S. Ichimiya; S. Kawaguchi; M. Kano; T. Wada; T. Torigoe; T. Yamashita; N. Sato

11 - FEASIBILITY OF VERY HIGH DOSE METHOTREXATE (VHD MTX) 12G/SQM TO 34 G/SQM : A RETROSPECTIVE STUDY OF 771 COURSES PERFORMED IN 46 PATIENTS WITH HIGH RISK OSTEOSARCOMA ( OS )
(Viabilidade de dose muito alta de methotrexate (VHD MTX) 12 g/m² a 34 g/m²: um estudo retrospectivo de 771 programas realizados em 46 pacientes com osteosarcoma de alto risco (OS))
H. Cornille; G. Delepine; B. Markowska; N. Delepine

12- VALIDITY OF AN AUTOMATIC MEASURE PROTOCOL IN DISTAL FEMUR FOR ALLOGRAFT SELECTION FROM A THREE-DIMENSIONAL VIRTUAL BONE BANK SYSTEM
(Eficácia de um protocolo de medida automática no fêmur distal para seleção de aloenxerto de um sistema de banco ósseo virtual tridimensional)
L. Aponte-Tinao; L. Ritacco; G. Farfalli; M. Ayerza; D. Muscolo; C. Seiler; M. Reyes; L. Nolte

13- EFFECT OF VANCOMYCIN ON INHIBITION OF IN VITRO GROWTH OF OSTEOSARCOMA CELLS
(Efeito de vancomicina na inibição de crescimento in vitro de células de osteossarcoma)
R.P. Dunlay; S. Wang; P. Moodie; T.E. McIff; K.J. Templeton; R. Garimella



Apesar de serem poucos os estudos para osteossarcoma, tenho confiança de que possam trazer inovações nas terapias atualmente utilizadas. Por ser considerado um tumor relativamente pouco frequente, poucas drogas são testadas e produzidas, tendo em conta que o retorno financeiro é inferior a outras neoplasias malignas como câncer de mama, próstata e pulmão, que lideram todas as estatísticas.

Dificilmente terei acesso aos estudos acima, entretanto fico feliz pelo simples fato de existirem. Particularmente, achei muito interessante e torço por resultados positivos dos estudos 8 e 13, nos quais novas drogas (sorafenib e vancomicina) estão sendo testadas. É mais uma esperança para quem vive ou viveu um osteossarcoma e as chances de aumento na sobrevida crescerão conforme surgirem novos tratamentos, portanto espero que tenha se conseguido alguma correlação positiva.

O estudo 11 também me chamou bastante a atenção. Atualmente, os protocolos de osteossarcoma mais utilizados prevêem 12g/m² de methotrexate e a pesquisa é sobre um possível aumento de dosagem para 34g/m² em casos de alto risco. Fico imaginando o impacto de uma dose como esta no organismo humano, levando em consideração que os níveis de administração atuais já apresentam efeitos colaterais significativos. É uma pena não ter acesso ao estudo para divulgar maiores detalhes e resultados.

Para quem quiser saber o programa completo do encontro, no qual aparecem estudos de outros tipos de sarcomas, segue link:
http://www.ctos.org/meeting/2010/program.pdf

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ainda Sobre o Chá Verde

Com a contribuição da nossa amiga Carin, encontramos um artigo que contra-indica o uso do chá verde concomitante à quimioterapia com BORTEZOMIB, utilizada em pacientes com mieloma múltiplo. De qualquer forma, sugiro a quem esteja recebendo quimioterapia ou qualquer outro tratamento que consulte seu médico antes de fazer uso mais efetivo do chá verde. Para quem não está em qualquer tratamento não existem contra-indicações, exceto para quem tem alguma restrição à cafeína.

Navegando pela internet encontrei uma reportagem com David Servan-Schreiber, autor de Anticâncer - Prevenir e vencer usando nossas defesas naturais, que foi apresentada no Globo Repórter há um tempo. A reportagem fala um pouco sobre a trajetória do pesquisador no combate à doença e também sobre a sua teoria anticâncer.






terça-feira, 9 de novembro de 2010

Chá Verde

É uma das discussões do momento na oncologia. Afinal, até que ponto a alimentação tem in- fluência no desenvol- vimento de tumores no nosso organismo? Alguns dizem que ainda não existem evidências cla- ras a respeito dos bene- fícios de uma alimen- tação saudável no que diz respeito à prevenção do câncer. Outros a- firmam e envidam esforços em pesquisas muitas vezes carentes de recursos na tentativa de estabelecer correlações positivas.

Fato é que existem muitos interesses (ou desinteresses) por trás de tudo isso. A bilionária indústria farmacêutica jamais investiria em pesquisas para analisar os efeitos do brócolis, do chá verde ou do cúrcuma na prevenção do câncer. Isto não significa que a culpa é das empresas que detêm as maiores fatias do mercado farmacêutico. É plenamente concebível que não invistam nessa área por não ser interessante economicamente. Estamos falando de empresas. Estamos falando de capitalismo (isto não é uma crítica, apenas uma constatação de como funciona o nosso mundo). Não fossem essas empresas e não teríamos tratamentos oncológicos tão avançados. Da mesma forma, ninguém desenvolve remédios apenas porque é "bonzinho". Existe a contrapartida financeira sempre e no caso da oncologia é uma bela contrapartida, mas isto é assunto para uma outra postagem.

Mas então quem deve investir em pesquisas desse tipo? Na minha opinião é o Estado. Trata-se de saúde pública, trata-se de bem-estar social, trata-se talvez de evitar uma epidemia ainda mais assustadora. Os números não mentem. Nas últimas décadas, principalmente no mundo Ocidental, o aumento do número de pacientes acometidos pelas variações da doença é desproporcional ao aumento da população. Os dados epidemiológicos dão conta desta dura realidade. Algo está errado. Algo tem que mudar.

A mim parece claro que existe algo errado no nosso modo de vida, mas isto é apenas uma opinião de alguém pouco experimentado no assunto. Apesar disso, me calcei de alguns estudos existentes na área, que apresentam indícios do que discorrerei a seguir.


O Chá Verde

O chá verde é uma bebida milenar que é fabricada a partir dos brotos novos de Camillia sinensis. Não se sabe exatamente sua origem, mais o mais provável é que tenha surgido na região da Índia e tenha chegado a China através da rota da seda.

A cultura ocidental incorporou o chá aos seus hábitos por volta de 1600, quando comerciantes portugueses começaram a importar a especiaria do mundo oriental. Nesta época, o chá era predominantemente verde, pois o chá preto ainda não havia se difundido na própria China. Ocorre que na sequência, devido à capacidade do chá preto de manter inalteradas suas propriedades, aroma e sabor por maior período de tempo, o chá verde passou a ser preterido e atualmente o chá mais consumido no Ocidente é preto.

A sua capacidade anticancerígena reside na abundância de polifenóis, especificamente flavonóis ou catequinas, que são moléculas complexas que agem no organismo humano inibindo a angiogênese, através do bloqueio do receptor de VEGF (ver o segundo vídeo da postagem Angiogênese). Até o momento, a Epigalocatequina-3-galato, mais conhecida como EGCG, é a molécula de origem nutricional mais poderosa nesse bloqueio.



A diferença entre o chá verde e o chá preto está no processo de fabricação. A fabricação do chá verde é capaz de manter a EGCG, enquanto que a do chá preto converte os polifenóis em pigmentos negros. Além disso, o chá verde tem até 4 vezes menos cafeína em sua composição.

In vitro, a EGCG foi capaz de inibir o crescimento de células de leucemias humanas, leucemias eritrocitárias, cânceres de rim, pele, mama, boca e próstata. Estudos em animais foram positivos para exposição a agentes cancerígenos causadores de cânceres de pele, mama, pulmão, esôfago, estômago e cólon. Um estudo publicado no Journal of Cancer Research & Clinical Oncology em 2004 sugere que a combinação do chá verde com a radioterapia em crianças com meduloblastoma traz mais efetividade ao tratamento. Outro estudo realizado em Harvard utilizando camundongos avaliou a combinação do chá verde com a soja e também apresentou resultados positivos na inibição do câncer de mama estrógeno positivo.

O ideal é que o uso do chá verde ocorra três vezes ao dia com infusões de 8 a 10 minutos (menos que 5 minutos só consegue extrair 20% das catequinas). Existem diferentes tipos de chá verde e a proporção de EGCG varia. Sencha-uchiyama, Gyokuro e Sencha são os que apresentam maior quantidade da molécula. Os três são japoneses. Deve-se consumir a bebida logo após o seu preparo, evitando as garrafas térmicas.

Faço uso do chá verde regularmente (ainda não atingi a frequência correta). O chá é muito gostoso e é perfeitamente possível dar conta das três xícaras por dia. Além disso, o hábito acaba por ajudar a criar outro hábito muito incentivado pelos nutricionistas, que é fazer cinco ou seis refeições por dia.

Para quem se interessar, seguem as fontes:
Anticancer: Prevenir e vencer usando as nossas defesas naturais - David Servan-Schreiber
Os alimentos contra o câncer - Richard Béliveau Ph.D., Denis Gingras Ph.D.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O Sol Voltou a Brilhar

O sol voltou a brilhar. Não falo apenas literalmente, o que seria justo em virtude da bela semana ensolarada que tivemos neste início de novembro. Ocorre que um novo tempo começou na minha vida. Um tempo de esperanças e desejos renovados. Mas o que seria capaz de desencadear isto? O que aconteceu de tão diferente? Nada.

No último ano (um pouco mais de um ano, é verdade) venci 15 ciclos de quimioterapia. Quinze. Durante a semana passada, mais precisamente entre domingo e sexta-feira, estive internado pela 11ª vez no Hospital da PUCRS. Décima primeira. Algo de diferente? Não.

É fato que a quimioterapia já se tornou algo corriqueiro na minha vida. Ainda assim, não consigo me acostumar a essa rotina. Principalmente esse dia-a-dia de hospital, esse estado de dependência em relação às pessoas que mais estimo, essa falta de liberdade, essa espécie de coleira que carrego no peito que me liga aos mais diversos medicamentos e, por conseguinte e paradoxalmente, me resgatará a uma vida normal. É como estar preso sem ter cometido qualquer crime.

Tantas vezes já tive vontade de arrancar os fios e me libertar dessa legítima tortura, mas, para minha fortuna, a sensatez acaba falando mais alto e passo a conviver com a ansiedade e com o marasmo com naturalidade. Isso não significa que eles inexistam, aliás, bem no sentido inverso, são bem concretos e visíveis no meu íntimo. Permaneço abraçado a eles pelo tempo necessário para que meu corpo se livre da droga que o salva.

O que resta de uma semana como essa são os novos horizontes que consigo enxergar. A cada ciclo é assim. Novas janelas se abrem. Novos caminhos se formam. Uma nova consciência se impõe. É impossível se manter inalterado. Aos meus renovados olhos, o Sol volta a brilhar após uma semana inteira de eclipse.

Resumindo toda essa conversa, a semana que se passou foi, como sempre, cansativa e extensa (a sensação é que um dia é mais longo que uma semana). Praticamente não tive náuseas, urinei bastante e os rins estiveram em perfeito funcionamento, tive dores pelo corpo em um nível normal, a língua apresentou um pouco de inchaço, o paladar esteve alterado e o apetite não foi internado comigo, ao menos não o vi por todo o tempo em que estive no hospital. Ainda prefiro todos estes efeitos ao tédio e à ansiedade. Por incrível que pareça, mesmo o tratamento sendo considerado agressivo e até mesmo violento ao corpo humano, os efeitos psicológicos experimentados são potencialmente mais danosos que os efeitos físicos. Outros pacientes podem ter opiniões distintas, mas até o momento no meu caso, esta é a verdade.

Agora terei um mês de folga pela frente. O próximo ciclo será no início de dezembro e até lá realizarei uma nova bateria de exames de imagem (tomografias de tórax, abdômen e membro inferior esquerdo e cintilografia óssea) para aferir o estado de meu organismo em relação ao câncer. Vamos torcer para que continue livre de qualquer manifestação da doença. Além disso, serei novamente submetido a um ecocardiograma, pois o próximo ciclo será a última aplicação de doxorrubicina (a droga vermelha). Depois disso serão mais duas internações e estarei pronto a remontar as coisas em seus devidos lugares.

Frase do dia: "A mente que se abre a uma nova idéia jamais voltará ao seu tamanho original." - Albert Einstein.


segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Enrolado

Estou internado desde ontem no quarto 912 do Hospital São Lucas da PUCRS. No momento estou recebendo methotrexate e soro simultaneamente. A aplicação já está no final e estou me sentindo bem. Agora a Denise está tirando uma foto minha para botar aqui no blog, mas não conseguirei postá-la hoje.
Estou totalmente conectado, mas não é só na internet. Um equipo me conecta à bomba que administra o soro. Outro me liga à bomba que administra a quimioterapia. Cada bomba está ligada a uma tomada diferente através dos respectivos cabos de força. Além disso tudo, ainda tem o cabo da internet e o fio do mouse. É muito fio. Às vezes me surpreendo todo enrolado em volta do "poste" (suporte para a medicação), mas já me acostumei a desfazer os nós.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Angiogênese

Em complemento à postagem anterior, encontrei os vídeos a seguir que explicam resumidamente a formação de um tumor e de uma metástase.






quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A Formação de um Tumor

Comecei a escrever a postagem sobre o chá verde, porém esbarrei em uma questão fundamental: para entender o eventual benefício é necessário primeiramente entender o mecanismo através do qual se formam e se desenvolvem os tumores malignos no nosso organismo. Para entender esse mecanismo, é importante conhecer como ocorrem o processo inflamatório e a angiogênese. Segue resumo.



A Inflamação

A inflamação é um fenômeno fisiológico que consiste em uma reação do organismo a uma agressão (lesão celular ou tecidual). Trata-se de um mecanismo de defesa do corpo, um fenômeno imunológico.

Resumidamente o processo inflamatório ocorre da seguinte forma:
Inicialmente as plaquetas se concentram no local afetado liberando substâncias químicas (PDGF - Platelet-derived growth factor ou "fator de crescimento de derivação plaquetária") que atraem os glóbulos brancos. Estes, por sua vez, irão liberar outros mediadores químicos (citocinas, quimiocinas, prostaglandinas, leucotrienos e tromboxanos) que irão conduzir todo o processo de reparação celular.

Primeiramente, elas irão dilatar os vasos sanguíneos da proximidade para viabilizar a chegada de células adicionais (como se tivessem aguardando reforços para o combate). Em seguida ativam a coagulação sanguínea em torno das plaquetas e tornam os tecidos adjacentes permeáveis, facilitando o acesso das células imunológicas. Por fim, promovem a multiplicação das células do tecido afetado de modo a suprir o espaço deixado e formam novos vasos sanguíneos para o transporte de oxigênio e nutrientes ao local reconstruído.


Em harmonia, os processos inflamatórios são essenciais ao organismo. Uma característica importante é que são autolimitados, ou seja, tão logo cesse a necessidade de reparações, cessa também o crescimento de novos tecidos.




A Angiogênese

A angiogênese é o fenômeno pelo qual são criados novos vasos sanguíneos a partir de outros já existentes. O surgimento de novos vasos ou capilares acontece em circunstâncias bem específicas: durante o crescimento, após as menstruações e na reparação de lesões.




A Formação de um Tumor

Por motivos diversos (exposição a agentes carcinogênicos, predisposição genética...), uma célula sofre mutação. O resultado é uma célula desorganizada, geneticamente alterada e diferente das demais células que compõem o tecido na qual está localizada.

O sistema imunológico é chamado a intervir, porém de maneira perversa as células cancerosas se utilizam do processo inflamatório gerado naturalmente em torno de si para crescer. Elas passam a produzir mediadores químicos (as mesmas citocinas, quimiocinas, prostaglandinas, leucotrienos e tromboxanos) que potencializam a sua própria multiplicação e tornam permeáveis os tecidos adjacentes, facilitando a sua proliferação e penetração no fluxo sanguíneo, o que permitirá o surgimento de metástases.


Em um processo inflamatório normal os mediadores químicos param de ser produzidos tão logo os tecidos estejam reparados, porém nesse caso a produção não é interrompida. Essas substâncias se tornam abundantes no local, ocorrendo apoptose (suicídio celular) nos tecidos vizinhos, de forma a impedir a proliferação anárquica dos tecidos. O excesso de fatores inflamatórios desorienta os glóbulos brancos. Sendo assim, o tumor não é mais atacado e passa a aumentar de forma desorientada.


Como ocorre em qualquer célula, para sobreviver, crescer e se multiplicar as células cancerosas precisam de nutrientes e oxigênio. O abastecimento é feito através de novos capilares formados pelo tumor (angiogênese). A formação destes vasos é estimulada pelo tumor ao liberar "angiogenina", substância que atrai os vasos existentes na sua direção através de novos caminhos. Desta forma, o tumor se torna sustentável e passa a crescer e se disseminar pelo organismo.


Em síntese, para ocorrer o surgimento de um tumor as células cancerosas se utilizam do sistema imunológico, promovendo o processo inflamatório e desorientando as células de defesa. Além disso, através da angiogênese um tumor se torna capaz de receber oxigênio e nutrientes que resultarão na sua sobrevivência e permitirão seu desenvolvimento e proliferação no organismo.



O objetivo desta postagem era apenas introduzir o assunto para os que acompanham o blog, de modo a facilitar o entendimento de postagens futuras. Infelizmente não encontrei figuras esquemáticas que representem os processos descritos e facilitem a compreensão dos mecanismos, mas caso encontre, atualizarei a postagem. A fonte é o livro "Anticâncer - Prevenir e vencer usando nossas defesas naturais" de David Servan Schreiber. No livro outras diversas fontes são citadas. Se alguém quiser saber mais, recomendo a leitura.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

14º Ciclo Vencido

Um a mais na conta. Ou a menos. Depende do ponto de vista. É mais uma batalha que foi vencida, é menos uma batalha a lutar. Um ano atrás eu não conseguiria imaginar estes números. Quatorze por um lado, quatro por outro. Da mesma forma, ainda não consigo imaginar os números ainda mais importantes. Dezoito por um lado, zero por outro. Este zero que pode ter tantos significados, zero câncer, zero tratamento, zero internações, zero ansiedade, zero sofrimento. Difícil imaginar. Difícil realizar. Uma emoção inenarrável quando acontecer.

O 14º ciclo foi muito tranquilo. Eu diria que foi o ciclo mais tranquilo até agora. Internei no dia 03/10/2010, isto mesmo, no dia das eleições, após cumprir com a minha obrigação de cidadão brasileiro (eu preferiria dizer exercer meu direito ao voto em uma sociedade democrática, mas acontece que o voto ainda é obrigatório, portanto não estou exercendo um direito e sim cumprindo as normas do Estado). Recebi 14g de methotrexate no dia seguinte, a menor dose até o momento e fui liberado na sexta-feira da mesma semana. Todos os índices acompanharam a curva correta. Os rins funcionaram bem e não senti muitos efeitos colaterais.

Enfrentei bem mais essa semana de internação. A reclusão não é muito agradável, mas já desenvolvi ferramentas para ajudar a combater a ansiedade e fazer o tempo passar um pouco mais rápido. Pontuei algumas ideias a seguir.


1- Evitar pensar no tempo
Pensar no tempo é algo que faz o tempo dilatar. O paciente normalmente fica ansioso pensando e calculando quanto tempo ainda falta para sair da reclusão. O interessante é que várias vezes me peguei contando o tempo em função de variáveis secundárias, por exemplo: "faltam três 'Jornais do Almoço' para ir embora" ou "não acredito que ainda tenho que encarar mais dois 'Vídeo Show' ainda".

2- Evitar a cama
Nas primeiras internações eu passava muito tempo na cama. Acordava e não tinha vontade de levantar. Acabava ficando praticamente o dia todo deitado. Isto é muito ruim. Temos que considerar que a partir de um certo tempo (normalmente a partir de terça-feira) já não existe mais sono, portanto mesmo que se fique deitado, não se consegue dormir. Além disso, o humor ficava horrível, a cabeça vazia pensando besteira, sentia menos vontade de comer e sentia mais dificuldades em ir aos pés. Enfim, a cama não ajuda o tempo a passar mais rápido na nossa cabeça, nos debilita fisicamente e psicologicamente. Portanto, cama só para dormir.

3- Evitar a TV nos horários que não agradam
A televisão do hospital é quatorze polegadas. A distância da cama, do sofá e da poltrona que existem no quarto até a televisão é grande. Os canais disponíveis são os da TV aberta. Não bastasse tudo isto, a imagem é ruim, cheia de sombras e toda tremida. Apesar disso, a televisão realmente ainda ajuda bastante a passar o tempo nas horas em que a programação é pelo menos razoável (poucas horas no dia). Então assisto apenas os programas que tenho vontade. Programo toda a minha rotina (almoçar, lanchar, jantar, ir ao banheiro e tomar banho) de acordo com a TV. Adiei meu horário de almoço em quase duas horas para acompanhar todos os noticiários e programas esportivos que passam entre as 12h e as 14h. Da mesma forma, tomo banho ou no horário dos filmes imbecis ou no horário da pior novela do momento. Tento segurar as idas ao banheiro durante os programas, reservando os horários de propaganda para realizar minhas necessidades fisiológicas. É claro que com a rotina "exaustiva" que tenho no hospital não é possível completar todo o espaço de programação ruim da TV. Esse tempo que sobra (é muito tempo!) reservo para o item a seguir.

4- Realizar atividades que der vontade
Levo sempre um livro e o notebook para o hospital, então dá para ocupar o tempo com estas atividades. Leio um pouco. Jogo um pouco. Navego na internet um pouco. Torno a ler. E assim segue. Outra atividade que no meu caso não se aplica devido à total ausência de dom é a música. Para quem sabe tocar algum instrumento, nada melhor do que aproveitar o tempo para tentar tirar aquela música nova ou então aquelas velhas e boas de sempre. Cheguei a comprar um violão. Tentei tocar, aprendi algumas coisas, mas falta o dom. Não tive a paciência necessária e acabei largando o instrumento. Agora ocupo meu tempo com as aptidões que não me faltam.

5- Olhar para a rua
As janelas do quarto são bem altas e enormes, mas vou várias vezes até elas para contemplar a rua. Consigo ver algumas árvores, alguns morros, o estacionamento do hospital e a avenida Ipiranga, sempre movimentada.

6- Tomar banho com bastante calma
Sei que não é ecológico, mas ficar um tempo a mais no banho faz uma diferença enorme no humor. Deixar a água quente cair um pouco sobre o corpo por vezes dolorido, ajuda muito a desestressar e relaxar. Também não posso exagerar, pois a bateria da bomba de administração de soro acaba rápido, mas vale a pena gastar uns 20 minutos embaixo da água quente.

7- Conversar com quem estiver perto
No meu caso, minha mãe, meu pai e a Denise me acompanham sempre. Sempre tem alguém comigo. Às vezes o assunto acaba, mas aí a gente repete, fala de novo das mesmas coisas, lembra de alguma coisa do passado. Assim o tempo acaba andando mais rápido. Quando o pessoal da enfermagem entra no quarto também vale a pena dar uma palavrinha.

8- Receber visitas
Acho que esta é a maneira mais eficaz de fazer o tempo passar. Receber visitas dos amigos ou familiares faz o tempo voar. Na última internação recebi várias visitas, todas me ajudaram muito a conter a ansiedade.



Hoje foi dia de consulta. O Dr. Júlio prescreveu alguns exames de sangue para verificar como estão os índices. Agora já é hora de ir dormir, porque amanhã (tecnicamente hoje, mas como eu ainda não dormi, para mim é amanhã) pela manhã eu tenho que fazer um deles.




Assistindo Resident Evil 4 - 3D